a crítica
Este é sem dúvida o filme mais político de Eastwood, mas também é mais uma vez um retracto humano soberbo, com o qual Leonardo di Caprio faz um trabalho à altura de Howard Hughes, personagem que interpretou aquando de «O Aviador» de Martin Scorsese em 2004. Aqui falamos de um homem obcecado pelos detalhes e pela informação, como diz a frase publicitária que acompanha o filme: "informação é poder". E ninguém melhor do que J. Edgar Hoover para representar esta frase. Eastwood retracta Hoover como alguém socialmente distante, através de uma relação complexa com a mãe que toma contornos quase edipianos e incestuosos. Como resultado desta insociabilidade, Hoover encontra na homossexualidade e na relação com Clyde Tolson (Armie Hammer) um escape. Neste âmbito, Eastwood pode deparar-se com algumas críticas, por implicar que a direcção sexual de Hoover foi mais uma patologia, do que propriamente uma vontade expressa e natural como vemos em Tolson. Ou seja, não é um desejo reprimido que leva Hoover a encetar a relação com Tolson, mas uma fuga ao mundo do normal e quotidiano, do qual sempre fugiu ou foi desviado pela relação maternal. Embora proeminente no filme, a sexualidade de Hoover é apenas um ponto em que Eastwood pega, deixando à promiscuidade entre a política e instâncias emergentes de poder, a centralidade do filme a partir de dois momentos chave. O primeiro quando Hoover é nomeado director do FBI e impõe como condição principal o seu departamento não ser influenciado por interesses partidários. No entanto, já num segundo momento, esse poder político-partidário passa a ser visto como um meio para atingir ainda mais poder. Hoover passa a dispôr de informação secreta que visa, por um lado, obter favores de políticos e por outro, salvaguardar a sua posição contra ataques de novos poderes instaurados. Note-se que Hoover ascende ao lugar que ocupa com uma busca incessante de um inimigo para o Estado que viabilize a existência do FBI, várias vezes através de uma perversa utilização do poder da informação como nas sequências com o irmão de JFK, na carta a ser dactilografada para Martin Luther King e no aparato com a comunicação social aquando da captura de vários criminosos. Esta sede de poder pela informação leva a que Eastwood caracterize Hoover de forma ingénua, ao fazer-nos vê-lo como um homem que tem príncipios e motivações de defesa do Estado norte-americano, mas que mais tarde torna-se um mero empecilho com a chegada de alguém ainda mais megalómano como Richard Nixon. Tal como Aristóteles nos dizia que todo o homem é um animal político, «J. Edgar» permite-nos perceber que independentemente dos motivos, a informação é um instrumento poderoso que serve a política através do Homem. A questão principal é perceber que carácter terão esses homens.”
Paulo Figueiredo,
Cinema PTGate
(...) mostra-nos como as imagens produzidas pelas instâncias são o resultado de um ponto de vista que se encontra sujeito a todo o tipo de distorções. E, nesse gesto de desmistificação (que, diga-se, nunca vai tão longe quanto poderia e deveria ir) reside, sem dúvida, a grande força do novo Eastwood”
Vasco Baptista Marques,
Expresso